Sabemos que, após o fim da pandemia – porque não há mal que dure para sempre – voltaremos a frequentar o Fórum e as salas de advogados, mas sabemos também que, de alguma forma, não será mais como antes.
Por Júlio Gomes.
Estamos vivendo um tempo de mudanças e adaptações, em que criamos algo novo em nossa conduta cotidiana para satisfazer às novas necessidades, mas sem desapegar totalmente de tudo o que gostávamos e, para nossa enorme surpresa, até de algumas coisas que não gostávamos, mas que hoje vemos com outros olhos.
Assim está sendo com nossas famílias, com nossos conhecidos e com nosso exercício profissional.
Recentemente, senti enorme saudade da sala de advogados do Fórum Cível de Ilhéus. Naquele cantinho do segundo andar muitas vezes, além do café, da água e de ocasionais biscoitos, invariavelmente encontrávamos colegas, uns que gostamos muito, as vezes outro que nem tanto, mas sempre sentindo o calor humano do trabalho entre iguais.
Como não lembrar do quase onipresente Alberto Barreto? E da querida colega Necy, idosa e admiravelmente atuante com sua bengalinha e sua energia incomparável?
Como esquecer das canecas penduradas na copa com o nome dos advogados, das discussões sobre política ou das conversas mais rasas e até fúteis que, se antes podiam nos entediar, agora nos fazem lembrá-las sorrindo?
Como não rever mentalmente, naquela pequena sala, a cada jovem advogado, do garboso infante à linda persona feminina em seus elegantes trajes advocatícios; ou o pedido de socorro de alguém em véspera de audiência; ou mesmo o colega que saiu correndo porque o pregão o convocou para audiência em outro andar!
As saudades se estendem do cível ao trabalhista, onde rememoramos as mesas de audiência com uma dezena de advogados em pé à nossa volta, acompanhando a audiência entre silêncios e cochichos, muitas vezes maliciosos, mas quase sempre bem-humorados.
Como não sentir falta da voz rouquenha de Dr. Carlinhos e de seu jeito peculiar de ser, impregnados nas paredes do Fórum Trabalhista em uma saudade que nada poderá curar.
Até o burocrático balcão da Justiça Federal às vezes nos provoca certa nostalgia, porque saudades mesmo de peregrinar em balcões, nenhum advogado tem!
Sabemos que, após o fim da pandemia – porque não há mal que dure para sempre – voltaremos a frequentar o Fórum e as salas de advogados, mas sabemos também que, de alguma forma, não será mais como antes.
A vida é assim: aperta, abafa, alivia, surpreende, faz rir e, às vezes, faz chorar, e manda prosseguir sempre, inexoravelmente.
Não sabemos ao certo como será esse futuro em que nossos escritórios se tornaram salas de audiência e onde nos falamos a cada minuto pelo WhatsApp enquanto estamos, na verdade, distantes uns dos outros.
Mas, de alguma forma, quero voltar a sentir o calor do café e das pessoas nas nossas salas de advogados, e poder pendurar uma xícara com meu nome gravado ao lado e bem pertinho das dos demais colegas, enquanto ganhamos o pão de cada dia na alegria de não estarmos sós.
Julio Cezar de Oliveira Gomes é graduado em História e em Direito pela UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz
